
DE OESTE A LESTE
relatos de turista
A hospitalidade tranquila apesar das propagandas estranhas foi o que cativou.
A beleza natural,
A reflexo do sol no mar,
O vai e vem das ondas,
O barulho do vento pelas ruas sinuosas,
A comida farta, gostosa, barata
A sensação inesperada de ser turista na própria cidade,
Conhecer gente e ouvir histórias naturalmente.
A ideia de conhecer uma pessoa
E deixar que ela te leve a outro, e a outra, e a outra...
Territórios Dinâmicos
Numa cidade onde todos os territórios estão bem delimitados, ser forasteiro em um local onde eles estão em constante movimento, pode ser perigoso. E isto é percebido nos olhares alheios dos nativos. “Daqui pra lá, eu não ando.” “Não posso ir além daquele limite.” Paredes invisíveis que modificam as relações entre todos os cidadãos que ali vivem. E fortalece o temor de viver a cidade.
Águas da Barra
Águas cor de sangue
Maré vermelha (explicação cientifica)
apocalipse
Violência
Barracas
Diversão
Territorios
Uma zona neutra
Em 1953, a ONU criou uma zona desmilitarizada (neutra) entre as duas Coreias, para que ocorresse um cessar-fogo na Guerra da Coreia. Mas não foi difícil achar uma zona neutra por aqui. Uma rua que separa duas zonas de guerra. Dois territórios inimigos. Dois lados de um conflito que não aflige a zona neutra. Um recanto de paz no meio de uma disputa sem fim.
Ecosofia
O mar é som, é voz, é poesia.
O mar é puro, místico, profundo.
O mar é abrigo, é esconderijo, é imensidão.
A superfície é frágil, uma membrana, uma visão.
O mar é limite e é caminho, abrigo e perigo, perene e
Turista! Pensei.
O mar é fonte de vida e é ponto final.
Histórias nascem e morrem na imensidão azul.
Historias nascem e morrem na superfície.
Historias nascem e morrem na beira.
Na barra.
Na areia.
No morro.
Na praça.
No asfalto.
Diversidade extinta.
De vida marinha,
De vida terrestre,
Liberdade,
Humanidade.
Um destino: a Barra.
Uma propaganda: nada de mortes mais por aqui.
Uma primeira impressão.
Tic-tac
Meio dia e meia
Um bar, um mar, uma água de coco, um gole.
Brisa, mar, maresia, mergulho.
Um colóquio incomum, um estranho fluente em inglês.
Mais coco, polpa e água.
Tic-tac
Quase uma
Fome, ronco, onde?
Anda, ô de casa,tem comida?
Peixe, baião, farofa.
Mais alguma conversa jogada fora…
Uma mãe, e uma filha.
De volta ao Marco, um guia.
Anda, dobra esquina.
Olá de novo, obrigada pela comida!
Anda, conversa, dobra.
Um salão, várias casas, muitas igrejas.
Caminha, olá, cumprimentos,e aí?
Lama, lixo, resquício de chuva.
Anda, casa, campo.
Ah, como era bom aqui…
Por quê?
Paredão de som.
Não tem mais?
Não, policia proibiu.
Anda, casa, igreja, bordel.
Caminha, conversa, pergunta:
E os assaltos?
Acabaram.
Por que?
Pra policia num vi. Atrapalha os negócios do pessoal
E as mortes?
Ainda tem.
Mas a policia não vem?
Não, só o camburão.
Anda, anda, anda.
Dobra, praia, calçadão.
Daqui em diante é melhor não.
Território, divisa, perigo.
Desce avenida, feira, adentra.
Anda, calor, suor.
Quanta igreja!
Criança, bola, cachorro.
Perambula, casas, casas.
Ei, são do Cuca?
Não.
Cara de Cuca.
Conversa vai e vem.
Mais fundo, na beira, o morro.
Sobe, rua, ruela, viela.
Aperto, suor, abafado.
Anda, beirada do morro.
Criança, pipa, pimenteira.
Lama, areia, calor.
Desce, volta ao marco.
Obrigada, até breve.
Quem sabe.
Cansaço, ânimo, surpresa, curiosidade.
Até mais, Barra!
Mercado
Pesca de silêncio. Isca de medo. Técnica da violência. O produto é o polvo engaiolado, afogado no contentamento, refém da própria liberdade.
Sabe aquelas cenas de novela em que decidem falar da favela e da interação entre os personagens ricos e os pobres? Infelizmente, foi assim que me senti em determinado momento. De imediato, não consegui me desprender do medo, da sensação de pisar em solo completamente desconhecido, de estar num labirinto que nem sabia se tinha saída, de ter como guia alguém que conhecia a menos de dez minutos. O objetivo naquele momento era esquecer que estava ali por conta de um trabalho da faculdade, era pisar firme e não deixar transparecer que eu não estava tão à vontade quanto gostaria. E eu gostaria mesmo de estar me sentindo em casa. Com um tempo percebi que apesar de já ter caminhado bastante, não sentia meu corpo cansado. Praticamente não sentia meu corpo. Não me importava com a roupa suada, com as coisas que decidi carregar, com o cabelo assanhado, com a pele que ardia. Mas algo aqui dentro ainda se importava com as peças que claramente não se encaixavam. E as peças eram meus colegas e eu. Particularmente, tento colocar uma dose de humor em tudo que faço, principalmente quando sinto tensão, insegurança. Decidi contar igrejas. Uma atitude bem boba, tendo em vista que estudo urbanismo, que assumi postura de pesquisador, e que a propósito, estava no meio do meu campo de estudo. E estava sendo observado. O tempo todo. Ou foi assim que me senti na
maioria do tempo. Tolice. De novo.
- Ei! Vocês são do CUCA?
Penso.
- Um estranho falou comigo. Foi comigo? Eu não sei o que responder! Não sei como agir!
Na verdade, eu só quero que ninguém me veja.
O guia deu a única resposta possível, a verdadeira: não. E eu me questionei profundamente por qual motivo senti medo daquela interação. Me questionei ainda mais. Medo? Porque eu senti medo de uma pergunta? Eu até pensei que naquele lugar não existia nada de errado. O errado estava de passagem, e era eu, éramos nós. Eu olhava para meus colegas e buscava neles a segurança que por muito tempo faltou em mim. Até que eu adormeci completamente. Não sentia nada.
O tour chegou ao fim e mais do que nunca o conceito de turista veio em minha cabeça. Eu era um turista? Eu sou um turista? Eu sou um turista da minha própria cidade? Se eu acho que cidade é aquele percurso que faço entre minha casa, a universidade e os poucos lugares a que pouco frequento, e que fora disso o território é um desconhecido e por muitas vezes perigoso, me pergunto se posso um dia compreender o que é cidade, cidade de gente, de casa de gente, de rua com gente, de “Ei! Vocês são do CUCA?”.
Contei 14 igrejas. Mas podem ser 16.
Aquele é um povo de fé.
Na verdade só contei o que tinha placa.
Julguei pelo letreiro.
Não sei o que há de fato por dentro, nas entranhas, nas ruelas.
Eu que não quis ver ou eles que não querem mostrar?
É, eu tenho muito a entender.
Entre os ratos e os diabos,
Entre o mar e o morro,
Há famigerados
Aqueles que sabem o que é estar vivo.